Previsão da evolução dos casos de síndrome respiratória aguda grave (SRAG) e da ocupação hospitalar na rede pública (SUS) no município do Rio de Janeiro para o período de 01/abril a 21/abril

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Nota técnica divulgada em 6 de abril de 2020.

O LEGOS trata o problema de prever a evolução do total de internações de pacientes com síndrome respiratória aguda grave (SRAG) na rede pública (SUS) no município do Rio de Janeiro. Para chegar aos resultados que serão apresentados a seguir utilizamos uma base de dados entregue pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS). A série histórica de internações por SRAG em hospitais do SUS é apresentada abaixo.
Data Casos confirmados Data Casos confirmados

16/02/2020[1]

1

11/03/2020 17

17/02/2020

2

12/03/2020

20

18/02/2020

2

13/03/2020

24

19/02/2020

2

14/03/2020 30
20/02/2020

3

15/03/2020

36

21/02/2020

3

16/03/2020

50

22/02/2020

3

17/03/2020

84

23/02/2020

3

18/03/2020

117

24/02/2020

3

19/03/2020 157
25/02/2020

4

20/03/2020

189

26/02/2020

4

21/03/2020 212
27/02/2020

4

22/03/2020

230

28/02/2020

5

23/03/2020

267

29/02/2020

5

24/03/2020 291
01/03/2020

5

25/03/2020

320

02/03/2020

7

26/03/2020 333
03/03/2020

9

27/03/2020

362

04/03/2020

11

28/03/2020 388
05/03/2020

11

29/03/2020

408

06/03/2020

11

30/03/2020 427
07/03/2020

11

31/03/2020

455

08/03/2020

13

01/04/2020 462
09/03/2020

14

02/04/2020

469

10/03/2020

15

03/04/2020

470

Observando as figuras acima podemos perceber que no município do Rio de Janeiro segue comportamento não linear. Entretanto, se separarmos este gráfico em 4 momentos diferentes podemos observar que:
  1. Dia 22/01 ao 01/03 a quantidade total de internações não ultrapassa 5 pacientes
  2. Dia 02/03 ao 09/03 há um platô por 4 dias (04/03 até 07/03) com média de 1 internação por dia.
  3. Dia 10/03 até 31/03 a quantidade total de internações cresce abruptamente e depois segue um “comportamento linear”.
  4. Dia 01/04 até 03/04 a quantidade total de internações cresce menos que o período anterior, mas é causado pela demora de suas notificações por parte das unidades de saúde.
Assim, para reproduzirmos o comportamento esperado para a próxima semana consideraremos que a base histórica útil à nossa série se inicia no dia 10/03 (quando o total de internações chega a 15 pacientes) e termina dia 31/03. Modelos de previsão Para estimarmos o total de internações por SRAG na rede pública municipal no horizonte de 7, 14 e 21 dias a frente (até 21/04) utilizamos modelos univariados consagrados da literatura e regressões apresentados abaixo:
  • Modelos de suavização exponencial (ETS);
  • Modelos auto regressivos integrados de média móvel (ARIMA);
  • Regressão Linear (RL);
Nenhum dos 3 modelos apresentados acima foi concebido para tratar de séries temporais de comportamento explosivo (como é o nosso caso). Entretanto, podemos realizar algumas transformações na série original apresentada para que a série transformada atenda às condições de “contorno” das técnicas apresentadas acima. Neste sentido, as principais formas comumente utilizadas em séries temporais são: diferenciação (neste caso, a série de internações por dia) e transformação logarítmica (elas também podem ser combinadas). Nas figuras abaixo são apresentadas a série original e cada série transformada (logarítmica, diferenciada e logarítmica-diferenciada) de casos confirmados no Município do Rio de Janeiro. Como o objetivo de trabalhar sobre a série mais estacionária possível (ainda que com tendência) trabalharemos sobre as duas séries que melhor apresentam este comportamento. A partir deste ponto chamaremos as séries escolhidas para prever o total de casos confirmados de série original (SO) e a série em escala logarítmica (SL) e apresentaremos abaixo características observadas de cada modelos e cada série.
  • ETS na série original (ETS SO): capturou o padrão de crescimento linear;
  • ETS na série em escala logarítmica (ETS SL): capturou o padrão de crescimento explosivo;
  • ARIMA na série original (ARIMA SO): capturou o padrão de crescimento linear;
  • ARIMA na série em escala logarítmica (ARIMA SL): capturou o padrão de crescimento explosivo;
  • Regressão linear na série em escala logarítmica (RL SO): capturou o padrão de crescimento linear;
  • Regressão linear na série em escala logarítmica (RL SL): capturou o padrão de crescimento explosivo.
Cada modelo apresentado acima terá um conjunto de parâmetros que podem levar a previsões bastante distintas e avaliar qual seria o melhor modelo apenas pelo menor erro de acordo com a ser critério escolhido pode nos levar a uma baixa assertividade na previsão. Com objetivo de dirimir deste risco, fizemos primeiramente a avaliação dos resíduos do modelo de cada modelo apresentado acima seguindo as seguintes questões:
  • Média igual a 0 pelo teste de Student;
  • Segue uma distribuição normal pelo teste de Shapiro-Wilk;
  • É independente e identicamente distribuído (não existe auto correlação estatisticamente significativa) pelo teste de Ljung-Box;
  • É homocedástico (a variância se mantém constante ao longo do tempo) pelo teste de heteroscedasticidade condicional auto-regressiva (ARCH).
A resposta de cada uma destas perguntas para cada modelo é apresentada na tabela abaixo. Para fins de simplificação nela colocamos apenas os p-valores encontrados. O nível de significância escolhido foi de 0,01, ou seja, trabalhamos com um intervalo de confiança de 99%.
Teste estatístico ets SO arima SO rl SO ets SL ARIMA SL rl SL
Student 0,68 0,77 1 0,73 0,74 1
Shapiro-Wilk 0,85 0,67 0,34 0,36 0,38 0,06
Ljung-Box 0,55 0,68 >0,01 0,98 0,83 >0,01
ARCH >0,01 0,15 0,04 >0,01 <0,01 >0,01
A tabela acima indica que apenas 2 modelos não deveriam ser rejeitados ao nível de significância de 0,01: ARIMA SO (modelo com crescimento linear) e ARIMA SL (modelo com crescimento exponencial). Os resultados de acurácia (precisão) olhando para a série histórica de todos modelos é apresentado na tabela abaixo. Nela, podemos observar que os dois modelos elegíveis pelo critério apresentado acima também levam a um menor média percentual absoluta do erro (MAPE) e erro quadrático médio (RMSE).
Modelos ME RMSE MAE MPE MAPE
ETS SO -1,15 12,17 9,78 19,33 24,47
ARIMA SO -0,61 8,80 6,98 1,78 6,85
RL SO 0,00 14,94 10,56 2,43 30,22
ETS SL 3,32 12,32 9,79 0,31 5,80
ARIMA SL 3,17 12,41 9,82 0,28 5,80
RL SL 11,47 93,37 63,16 -5,51 30,79
Avaliado o resíduo dos modelos e tendo em conta a acurácia dos seus sinais geramos para cada série selecionada 10.000 trajetórias possíveis. Os percentis escolhidos para definição dos cenários otimista e pessimista foram 0,1 e 0,9 respectivamente e o resultado destas previsões por cenário e por modelo é sintetizado na tabela abaixo.
Previsões ARIMA SO ARIMA SL
Dia Pessimista Mediano Otimista Pessimista Mediano Otimista
01/04/2020 492 481 469 535 482 455
02/04/2020 516 505 493 572 514 464
03/04/2020 539 528 516 607 547 491
04/04/2020 562 550 539 649 584 525
05/04/2020 584 573 561 690 620 559
06/04/2020 606 595 583 735 662 596
07/04/2020 629 617 605 785 705 635
08/04/2020 651 639 628 835 752 676
09/04/2020 673 662 650 890 802 718
10/04/2020 695 684 672 948 855 769
11/04/2020 717 706 694 1015 910 816
12/04/2020 739 728 716 1079 967 872
13/04/2020 762 750 739 1150 1032 928
14/04/2020 784 773 761 1223 1101 990
15/04/2020 806 795 783 1305 1172 1055
16/04/2020 828 817 805 1386 1250 1124
17/04/2020 850 839 827 1479 1329 1199
18/04/2020 873 861 850 1576 1420 1276
19/04/2020 895 883 872 1683 1511 1360
20/04/2020 917 906 894 1787 1611 1447
21/04/2020 939 928 916 1908 1719 1547
A combinação dos dois modelos a cada dia o menor valor para o cenário otimista, a média entre os dois modelos para o cenário esperado e o maior valor para o cenário pessimista pode ser observada na no gráfico abaixo. O objetivo dos modelos utilizados foi estimar com a maior precisão possível o total internações por SRAG em leitos SUS em um horizonte de tempo de 21 dias e, com base nos critérios apresentados, concluímos que a combinação dos modelos lineares e exponenciais se mostrou mais adequada. Não é possível, no entanto, extrapolar este método para um período maior de tempo e nem mesmo concluir, a partir de seus resultados, em que estágio o município está na curva esperada de uma epidemia. Estudos com estes objetivos necessitam de abordagens mais complexas e também são conduzidas dentro do LEGOS. Previsão de ocupação hospitalar Com base na previsão anterior para cada cenário o objetivo desta etapa é estimar a quantidade de leitos que deverão ser ocupados caso a previsão acima se confirme. Como a nossa previsão se deu sobre o total de casos tivemos de fazer a diferença do valor acumulado do dia contra o valor do dia anterior, em outras palavras, contabilizamos apenas as novas internações previstas apresentadas por cenário na tabela abaixo.
Dias Cenário pessimista Cenário esperado Cenário otimista
01/04/2020 81 26 0
02/04/2020 34 28 7
03/04/2020 38 29 30
04/04/2020 40 29 33
05/04/2020 43 31 33
06/04/2020 45 30 25
07/04/2020 47 34 22
08/04/2020 51 33 23
09/04/2020 56 36 22
10/04/2020 59 38 22
11/04/2020 63 39 22
12/04/2020 66 41 23
13/04/2020 69 43 22
14/04/2020 76 46 22
15/04/2020 83 47 22
16/04/2020 83 49 22
17/04/2020 90 51 22
18/04/2020 99 55 23
19/04/2020 103 58 22
20/04/2020 108 61 22
21/04/2020 118 63 22
Os tempos de internação observados são apresentados no histograma abaixo. Foram excluídos apenas um outliers como 0 e 209 dias. Ao invés da frequência observada contar o total de casos trabalhamos com a densidade de probabilidade para observar qual distribuição de probabilidade melhor se adequa aos valores observados. Ao nível de significância de 0,05 apenas são elegíveis as distribuições de probabilidade exponencial (p-valor de 0,745 com rate de 0,20) e weibull (p-valor de 0,053 com shape e scale de 1,23 e 5,33 respectivamente). O tempo médio de internação encontrado foi de 4,95 com desvio padrão de 4,67 dias. Cabe ressaltar que a ambas as curvas encontradas convergem com o que pesquisadores concluíram sobre o tempo de internação em na China e na Itália. Assim, executando 1000 replicações sobre os valores de cada cenário apresentado na tabela acima chegamos aos resultados apresentados na tabela  e figuras abaixo onde nos interessam, em cada horizonte de tempo: o menor valor previsto no cenário otimista, o valor médio previsto no cenário esperado, o maior valor previsto no cenário pessimista.
Horizonte de tempo Cenário pessimista Cenário esperado Cenário otimista
7 dias (08/04) 192 114 74
14 dias (15/04) 323 181 90
21 dias (21/04) 502 258 94
Cabe ressaltar que a grande distância entre os resultados observados em cada cenário ocorre:
  • Pela mistura de modelos
  • Por associar valores de máximo ou mínimo entre ambas as previsões nos cenários otimistas e pessimistas e, no cenário esperado, trabalhar com o valor médio entre as duas previsões.
  • Por utilizar percentis muito distantes da mediana nos cenários otimistas e pessimistas
Conclusão Considerando o ganho de capacidade de leitos cumulativo em etapas onde estão previstos:
  • 381 leitos na etapa 1 em um hospital municipal;
  • 85 leitos em hospitais e unidades de emergência espalhadas pelo município;
  • 500 leitos em um hospital de campanha em montagem atualmente;
  • 300 leitos cirúrgicos sendo convertidos para clínicos.
Podemos indicar os seguintes prognósticos por cenário considerando um total de 381 na etapa 1, 466 leitos na etapa 2, 966 leitos na etapa 3 e 1266 leitos na etapa 4.
Horizonte de tempo Cenário pessimista Cenário esperado Cenário otimista
7 dias (08/04) Atendido na etapa 1 Atendido na etapa 1 Atendido na etapa 1
14 dias (15/04) Atendido na etapa 1 Atendido na etapa 1 Atendido na etapa 1
21 dias (21/04) Atendido na etapa 3 Atendido na etapa 1 Atendido na etapa 1
Logo, apenas dia 21/04 no cenário pessimista as duas primeiras etapas previstas serão insuficientes. Sendo, nestas circunstâncias, necessário prover a estrutura necessária para atendimento prevista na etapa 3. Autor Daniel Assad Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0258423859812498 Coordenação do LEGOS|UERJ Profa Thaís Spiegel, DSc. | thais@eng.uerj.br Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8880192361495671 [1] A série histórica inicia dia 22/01 com a internação de um paciente. Entretanto, apenas dia 17/02 houve a segunda internação. Assim, decidimos colocar como primeira data o dia anterior (16/02).

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