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Nota técnica divulgada em 30 de março de 2020.
O LEGOS trata o problema de prever a evolução do total de casos confirmados de COVID-19 no município do Rio de Janeiro. Para chegar aos resultados que serão apresentados a seguir utilizamos a série histórica do referido município que está disponível no Painel Rio COVID SMS | IPP | COR. Esta série histórica é apresentada na tabela e figuras abaixo.
Data | Casos confirmados | Data | Casos confirmados |
06/03/2020 | 4 | 18/03/2020 | 63 |
07/03/2020 | 9 | 19/03/2020 | 63 |
08/03/2020 | 12 | 20/03/2020 | 94 |
09/03/2020 | 13 | 21/03/2020 | 103 |
10/03/2020 | 21 | 22/03/2020 | 170 |
11/03/2020 | 25 | 23/03/2020 | 214 |
12/03/2020 | 30 | 24/03/2020 | 278 |
13/03/2020 | 38 | 25/03/2020 | 331 |
14/03/2020 | 42 | 26/03/2020 | 366 |
15/03/2020 | 48 | 27/03/2020 | 431 |
16/03/2020 | 51 | 28/03/2020 | 489 |
17/03/2020 | 60 | 29/03/2020 | 515 |
Observando as figuras acima podemos perceber que no município do Rio de Janeiro segue comportamento não linear. Entretanto, se separarmos este gráfico em 3 momentos diferentes podemos observar que:
- Dia 07/03 ao 16/03 segue um “comportamento linear”;
- Dia 17/03 ao 21/03 houve um incremento da inclinação em relação ao “comportamento linear” apresentado no intervalo anterior.
- Dia 22/03 até o momento em que tivemos informação disponível (boletim de 29/03/2020 18:00) segue um “comportamento linear” novamente, mas decrescente.
Assim, para reproduzirmos o comportamento esperado para a próxima semana consideraremos que a base histórica útil à nossa série se inicia no dia 22/03 (quando o total de casos confirmados de pacientes com COVID-19 ultrapassa 150) e perdura até o momento. A alteração do “ponto de corte” da série em relação às notas técnicas anteriores levará a um resultado diferente por conta dos menores resultados de erro encontrados serem nos modelos lineares.
Modelos de previsão
Para estimarmos o total de casos de pacientes com COVID-19 confirmados no horizonte de 20 dias a frente (até 18/04) utilizamos modelos univariados consagrados da literatura e regressões apresentados abaixo:
- Modelos de suavização exponencial (ETS);
- Modelos auto regressivos integrados de média móvel (ARIMA);
- Regressão Linear (RL);
Nenhum dos 3 modelos apresentados acima foi concebido para tratar de séries temporais de comportamento explosivo (como é o nosso caso). Entretanto, podemos realizar algumas transformações na série original apresentada para que a série transformada atenda às condições de “contorno” das técnicas apresentadas acima. Neste sentido, as principais formas comumente utilizadas em séries temporais são: diferenciação e transformação logarítmica (elas também podem ser combinadas). Nas figuras abaixo são apresentadas a série original e cada série transformada (logarítmica, diferenciada e logarítmica-diferenciada) de casos confirmados no Município do Rio de Janeiro.
Como o objetivo de trabalhar sobre a série mais estacionária possível (ainda que com
tendência) trabalharemos sobre as duas séries que melhor apresentam este comportamento. A partir deste ponto chamaremos as séries escolhidas para prever o total de casos confirmados de série original (SO) e a série “logaritimatizada” (SL) e apresentaremos abaixo características observadas de cada modelos e cada série.
- ETS na série original (ETS SO): capturou o padrão de crescimento linear;
- ETS na série logarimitizada (ETS SL): não capturou o padrão de crescimento e se manteve constante ao longo do tempo;
- ARIMA na série original (ARIMA SO): capturou o padrão de crescimento linear;
- ARIMA na série logarimitizada (ARIMA SL): capturou o padrão de crescimento explosivo;
- Regressão linear na série logarimitizada (RL SO): capturou o padrão de crescimento linear;
- Regressão linear na série logaritimizada (RL SL): capturou o padrão de crescimento explosivo;
As previsões otimista, esperada e pessimista de acordo com cada modelo são apresentados nas tabelas abaixo. O intervalo de confiança escolhido para a geração dos cenários otimista e pessimista foi de 95%, ou seja, a probabilidade de observarmos um valor fora desta faixa de valores é de 5% caso o “comportamento linear” da série se mantiver.
Cenário otimista | ets SO | arima SO | rl SO | ets SL | ARIMA SL | rl SL |
28/03/2020 | 321 | 439 | 433 | 252 | 408 | 419 |
29/03/2020 | 276 | 470 | 481 | 202 | 453 | 514 |
30/03/2020 | 241 | 506 | 528 | 171 | 516 | 627 |
31/03/2020 | 212 | 543 | 574 | 148 | 596 | 763 |
01/04/2020 | 186 | 582 | 621 | 130 | 695 | 927 |
02/04/2020 | 163 | 621 | 667 | 116 | 815 | 1124 |
03/04/2020 | 141 | 662 | 713 | 105 | 960 | 1361 |
Cenário esperado | ets SO | arima SO | rl SO | ets SL | ARIMA SL | rl SL |
28/03/2020 | 431 | 479 | 475 | 431 | 536 | 613 |
29/03/2020 | 431 | 527 | 526 | 431 | 666 | 771 |
30/03/2020 | 431 | 575 | 576 | 431 | 828 | 971 |
31/03/2020 | 431 | 624 | 626 | 431 | 1029 | 1221 |
01/04/2020 | 431 | 672 | 677 | 431 | 1279 | 1536 |
02/04/2020 | 431 | 720 | 727 | 431 | 1590 | 1933 |
03/04/2020 | 431 | 768 | 777 | 431 | 1976 | 2432 |
Cenário pessimista | ets SO | arima SO | rl SO | ets SL | ARIMA SL | rl SL |
28/03/2020 | 541 | 519 | 517 | 736 | 704 | 897 |
29/03/2020 | 586 | 584 | 571 | 919 | 979 | 1159 |
30/03/2020 | 621 | 645 | 624 | 1089 | 1328 | 1503 |
31/03/2020 | 650 | 704 | 678 | 1257 | 1776 | 1955 |
01/04/2020 | 676 | 762 | 733 | 1427 | 2354 | 2547 |
02/04/2020 | 699 | 818 | 787 | 1599 | 3102 | 3324 |
03/04/2020 | 721 | 874 | 842 | 1776 | 4067 | 4344 |
Conforme comentado anteriormente, podemos descartar a priori o modelo ETS SL porque não foram capazes de capturar o crescimento que devemos prever. Assim, analisaremos apenas os resultados dos modelos ETS SO, ARIMA SO, ETS SL, ARIMA SL e RL SL. Para selecionarmos qual modelo deveríamos usar para estimar a quantidade total de casos esperados para os próximos 7 dias utilizamos os seguintes critérios:
- Teste de normalidade dos resíduos.
- ETS SO: p-valor =0,05695. Não podemos rejeitar a hipótese nula de normalidade.
- ARIMA SO: p-valor =0,6496. Não podemos rejeitar a hipótese nula de normalidade.
- RL SO: p-valor =0,9506. Não podemos rejeitar a hipótese nula de normalidade.
- ARIMA SL: p-valor = 0,6759. Não podemos rejeitar a hipótese nula de normalidade.
- RL SL: p-valor = 0,3218. Não podemos rejeitar a hipótese nula de normalidade.
- Teste de autocorreção dos resíduos (ACF). Nenhum dos resíduos das séries supracitadas apresentaram auto correlação.
- Menor média percentual absoluta do erro (MAPE) e menor erro quadrático médio (RMSE) dentre os modelos aprovados pelos critérios anteriores.
Modelos | ME | RMSE | MAE | MPE | MAPE |
ETS SO | 0,16 | 8,23 | 7,19 | -0,01 | 1,98 |
ARIMA SO | -0,02 | 12,33 | 10,23 | -0,24 | 2,73 |
RL SO | 0,00 | 8,11 | 7,24 | 0,10 | 2,02 |
ETS SL | -44,43 | 47,87 | 44,43 | -16,06 | 16,06 |
ARIMA SL | 10,29 | 22,30 | 18,01 | 2,14 | 4,33 |
RL SL | 0,46 | 25,21 | 19,79 | -0,23 | 5,87 |
Na tabela acima observa-se que o modelo ETS SO atende ao critério de menor MAPE, RL SO atende ao critério menor RMSE. Entretanto, com o objetivo de prover apenas uma previsão, combinamos os modelos RL SO e ETS SO considerando: o menor valor entre estas séries, a cada dia, para estimar a previsão otimista, o valor médio entre ambas para estimar o valor esperado por dia e o maior valor, a cada dia, entre elas para estimar a previsão pessimista. Assim, os próximos valores esperados de quantidade de casos confirmados de COVID-19 no Município do Rio de Janeiro em cada cenário são apresentados na figura e tabela abaixo.
Dias | Cenário otimista | Cenário esperado | Cenário pessimista |
30/03/2020 | 547 | 580 | 616 |
31/03/2020 | 596 | 632 | 671 |
01/04/2020 | 644 | 683 | 726 |
02/04/2020 | 693 | 734 | 780 |
03/04/2020 | 741 | 786 | 835 |
04/04/2020 | 790 | 837 | 890 |
05/04/2020 | 838 | 888 | 944 |
06/04/2020 | 887 | 940 | 999 |
07/04/2020 | 936 | 991 | 1053 |
08/04/2020 | 984 | 1042 | 1108 |
09/04/2020 | 1033 | 1094 | 1163 |
10/04/2020 | 1080 | 1145 | 1217 |
11/04/2020 | 1128 | 1196 | 1272 |
12/04/2020 | 1176 | 1247 | 1327 |
13/04/2020 | 1224 | 1299 | 1381 |
14/04/2020 | 1271 | 1350 | 1436 |
15/04/2020 | 1319 | 1401 | 1491 |
16/04/2020 | 1367 | 1453 | 1545 |
17/04/2020 | 1414 | 1504 | 1600 |
18/04/2020 | 1462 | 1555 | 1655 |
O objetivo dos modelos utilizados foi estimar com a maior precisão possível o total de casos de pacientes com COVID-19 em um horizonte de tempo de 20 dias e, com base no novo critério de corte dos dados históricos e novas observações, concluímos que a combinação dos modelos lineares se mostrou mais adequada.
Não é possível, no entanto, extrapolar este método para um período maior de tempo e nem mesmo concluir, a partir de seus resultados, em que estágio o município está na curva esperada de uma epidemia. Estudos com estes objetivos necessitam de abordagens mais complexas e também são conduzidas dentro do LEGOS.
Ressaltamos que não há garantias de que os tempos de internação utilizados na seção abaixo seja condizente com a realidade municipal ou nacional. Infelizmente, não foi possível ter acesso a estes tipos de dados em nenhuma fonte pública.
Previsão de ocupação hospitalar
Com base na previsão anterior para cada cenário o objetivo desta etapa é estimar a quantidade de leitos que deverão ser ocupados caso a previsão acima se confirme.
Como a nossa previsão se deu sobre o total de casos tivemos de fazer a diferença do valor acumulado do dia contra o valor do dia anterior, em outras palavras, contabilizamos apenas os novos casos e multiplicamos este número pela proporção de pacientes hospitalizados com caso de COVID-19 confirmados de acordo com o Painel Rio COVID-19. Esta proporção observada para o Município do Rio de Janeiro foi de 11,024% (38 pacientes internados, 17 altas e 1 óbito dividido pelo total de casos confirmados de 515 pacientes).
Assim, os casos previstos para os próximos 20 dias seguindo esta proporção (supomos que ela se manterá constante) é apresentada na tabela abaixo.
Dias | Cenário otimista | Cenário esperado | Cenário pessimista |
30/03/2020 | 3 | 7 | 11 |
31/03/2020 | 6 | 6 | 6 |
01/04/2020 | 5 | 5 | 6 |
02/04/2020 | 5 | 6 | 6 |
03/04/2020 | 6 | 6 | 6 |
04/04/2020 | 5 | 5 | 6 |
05/04/2020 | 5 | 6 | 6 |
06/04/2020 | 6 | 6 | 6 |
07/04/2020 | 5 | 5 | 6 |
08/04/2020 | 5 | 6 | 6 |
09/04/2020 | 6 | 6 | 6 |
10/04/2020 | 5 | 5 | 6 |
11/04/2020 | 5 | 6 | 6 |
12/04/2020 | 6 | 6 | 6 |
13/04/2020 | 5 | 5 | 6 |
14/04/2020 | 5 | 6 | 6 |
15/04/2020 | 5 | 5 | 6 |
16/04/2020 | 6 | 6 | 6 |
17/04/2020 | 5 | 6 | 6 |
18/04/2020 | 5 | 5 | 6 |
Devido à falta de dados relacionadas ao tempo de internação dos pacientes hospitalizados com COVID-19, utilizamos a distribuição de Weibull para estimar o tempo de internação destes pacientes como foi proposto pela pesquisa de Jombart et al. (2020) ao analisar os tempos de internação registrados de pacientes com COVID-19 na China.
Nesta pesquisa, os autores definiram que um alto tempo de internação poderia ser regido por uma distribuição de probabilidade de Weibull com os parâmetros shape = 2 e scale = 10 para internações de curta duração e shape = 2 e scale = 13 para internações de longa duração. Esta assunção faz com que na prática os tempos de internação variem de 7 a 14 dias com valor mais provável de 11 dias nos casos de internação longa e variem de 4 a 12 dias com valor mais provável de 8 dias nos casos de internação curta.
De acordo com especialistas brasileiros, atualmente os pacientes infectados por COVID-19 ficam internadas entre 10 e 30 dias com valor mais provável de 20 dias. Assim utilizamos a mesma distribuição de probabilidade proposta pelo estudo de Jombart et al. (2020) com parâmetros de shape = 2 e scale = 20. O formato desta curva que neste relatório será usado para estimar os tempos de internação de cada paciente é apresentado abaixo. Foram escolhidos parâmetros bem conservadores frente aos valores relatados com tempo médio de internação de 17,63 dias e desvio padrão de 9,21.
Assim, executando 1000 replicações sobre os valores de cada cenário apresentado na tabela acima chegamos aos resultados apresentados na figura abaixo onde nos interessam:
- O menor valor previsto no cenário otimista: 66 leitos;
- O valor médio previsto no cenário esperado: 85 leitos;
- O maior valor previsto no cenário pessimista: 104 leitos;
Uma vez estimada a quantidade de leitos podemos calcular o número mínimo de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem que são regidos por instrumentos normativos como, por exemplo, a RDC nº 07/2010 ou por outras “regras” estabelecidas por órgãos internacionais.
A título de exemplo, seguindo a proporção do Painel Rio COVID-19, dos 38 pacientes internados em hospitais municipais 23 (60,53%) estão em UTI’s. Logo, para o município do Rio de Janeiro devem ser ocupados entre 41 e 62 leitos com valor mais provável de 51 leitos. A partir desta estimativa de leitos seguindo a RDC nº 07/2010 na seção 3 que trata de recursos humanos deve-se garantir a disponibilidade de profissionais de terapia intensiva apresentadas na tabela abaixo.
Profissional de saúde | Cenário otimista | Cenário esperado | Cenário pessimista |
Médico diarista | 5 | 6 | 7 |
Médico plantonista | 5 | 6 | 7 |
Enfermeiro | 6 | 7 | 8 |
Técnico de enfermagem | 21 + 1 (apoio) | 26 + 1 (apoio) | 6 + 1 (apoio) |
Autor
Daniel Assad
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0258423859812498
Coordenação do LEGOS|UERJ
Profa Thaís Spiegel, DSc. | thais@eng.uerj.br
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8880192361495671